STJ - REsp 2023615 / SP 2022/0272239-0

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14/03/2023
20/03/2023
T3 - TERCEIRA TURMA
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE PRODUÇÃO ANTECIPADA DE PROVAS, COM FUNDAMENTO NOS INCISOS II E III DO ART. 381 DO CPC/2015 (DESVINCULADA, PORTANTO, DO REQUISITO DE URGÊNCIA/CAUTELARIDADE) PROMOVIDA PERANTE A JURISDIÇÃO ESTATAL ANTES DA INSTAURAÇÃO DE ARBITRAGEM. IMPOSSIBILIDADE. NÃO INSTAURAÇÃO DA COMPETÊNCIA PROVISÓRIA DA JURISDIÇÃO ESTATAL, EM COOPERAÇÃO (ANTE A AUSÊNCIA DO REQUISITO DE URGÊNCIA). RECONHECIMENTO. INTERPRETAÇÃO, SEGUNDO O NOVO TRATAMENTO DADO ÀS AÇÕES PROBATÓRIAS AUTÔNOMAS (DIREITO AUTÔNOMO À PROVA) PELO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.1. Controverte-se no presente recurso especial se, a partir da vigência do Código de Processo Civil de 2015, diante da existência de cláusula compromissória arbitral estabelecida entre as partes, a pretensão de produção antecipada de provas, desvinculada da urgência (ou seja, com fundamento nos incisos II e III do art. 381 do CPC/2015), deve ser promovida diretamente perante o Tribunal arbitral ou se subsistiria, também nesse caso, a competência (provisória e precária) do Poder Judiciário estabelecida no art. 22-A da Lei de Arbitragem.2. Uma vez estabelecida a cláusula compromissória arbitral, compete, a partir de então, ao Juízo arbitral solver todo e quaisquer conflitos de interesses, determinados ou não, advindos da relação contratual subjacente, inclusive em tutela de urgência, seja acautelatória, seja antecipatória. Todavia, com o escopo único de viabilizar o acesso à Justiça, na exclusiva hipótese de que a arbitragem, por alguma razão, ainda não tenha sido instaurada, eventual medida de urgência deverá ser intentada perante o Poder Judiciário, para preservar direito sob situação de risco da parte postulante e, principalmente, assegurar o resultado útil da futura arbitragem. Ressai evidenciada, nesse contexto, a indispensável cooperação entre as jurisdições arbitral e estatal.3. Sob a égide do Código de Processo Civil de 1973, dúvidas não subsistiam quanto à competência da jurisdição estatal para conhecer, provisoriamente, da ação de produção antecipada de provas, dada a natureza cautelar que o legislador, à época, lhe atribuía.Entretanto, a partir da vigência do Código de Processo Civil de 2015 - que não reproduziu, em seu teor, o Livro III, afeto ao Processo Cautelar, então previsto no diploma processual de 1973, e estabeleceu novos institutos processuais que instrumentalizam o direito material à prova -, adveio intenso debate no âmbito acadêmico e doutrinário a respeito da competência do Poder Judiciário para, em caráter provisório, conhecer de ação de produção antecipada de prova, no específico caso em que a pretensão apresenta-se desvinculada da urgência.3.1 Diante da existência de um direito material à prova, autônomo em si - que não se confunde com os fatos que ela se destina a demonstrar (objeto da prova), tampouco com as consequências jurídicas daí advindas, podendo (ou não) subsidiar outra pretensão -, a lei adjetiva civil estabelece instrumentos processuais para o seu exercício, que pode se dar incidentalmente, no bojo de um processo já instaurado entre as partes, ou por meio de uma ação autônoma (ação probatória lato sensu).3.2 Esta ação probatória autônoma não exige, necessariamente, que a produção da prova se apresente em situação de risco, podendo ser utilizada, inclusive, para evitar o ajuizamento de uma futura ação, seja pela constatação, a partir da prova produzida, da ausência de direito passível de tutela, seja para viabilizar a composição entre as partes. A ação de produção antecipada de prova, especificamente nas hipóteses estabelecidas nos incisos II e III do art. 381 do CPC/2015, apresenta-se, desse modo, absolutamente desvinculada da natureza cautelar ou de caráter de urgência (concebida como o risco de perecimento do direito à prova).4. Afigurando-se indiscutível o caráter jurisdicional da atividade desenvolvida pela arbitragem ao julgar ações probatórias autônomas, as quais guardam, em si, efetivos conflitos de interesses em torno da própria prova, cujo direito à produção é que constitui a própria causa de pedir deduzida - e resistida pela parte adversa -, a estipulação de compromisso arbitral atrai inarredavelmente a competência do Tribunal arbitral para conhecer a ação de produção antecipada de provas. A urgência, "que dita impossibilidade prática de a pretensão aguardar a constituição da arbitragem", é a única exceção legal à competência dos árbitros. Doutrina especializada.4.1 Esta compreensão apresenta-se mais consentânea com a articulação - e mesmo com a divisão de competências legais - existente entre as jurisdições arbitral e estatal, reservando-se a esta última, em cooperação àquela, enquanto não instaurada a arbitragem, preservar o direito à prova da parte postulante que se encontra em situação de risco, com o escopo único de assegurar o resultado útil de futura arbitragem. Ausente esta situação de urgência, única capaz de autorizar a atuação provisória da Justiça estatal em cooperação, nos termos do art. 22-A da Lei de Arbitragem, toda e qualquer pretensão - até mesmo a relacionada ao direito autônomo à prova, instrumentalizada pela ação de produção antecipada de provas, fundada nos incisos II e II do art. 381 do CPC/2015 - deve ser submetida ao Tribunal arbitral, segundo a vontade externada pelas partes contratantes.4.2 Em sendo a pretensão afeta ao direito à prova indiscutivelmente relacionada à relação jurídica contratual estabelecida entre as partes, cujos litígios e controvérsias dela advindos foram, sem exceção, voluntariamente atribuídos à arbitragem para solvê-los, dúvidas não remanescem a respeito da competência exclusiva dos árbitros para conhecer a correlata ação probatória desvinculada de urgência. Não cabe, pois, ao intérprete restringi-la, se as partes contratantes não o fizeram expressamente.5. Na hipótese retratada nestes autos, a cláusula compromissória arbitral - suficiente, em si, para afastar a jurisdição estatal - não poderia, inclusive, ser mais abrangente, cuja extensão abarca toda e qualquer disputa ou controvérsia societária que possa surgir entre os acionistas e a sociedade empresária (no que se insere o conflito em torno do direito à prova), relacionada ou oriunda, em especial, da aplicação, validade, eficácia, interpretação, violação e seus efeitos, das disposições contidas na Lei das S.A., bem como em seu estatuto social.6. O entendimento adotado pelo acórdão recorrido, além de fustigar o próprio fundamento da ação adotado pelos autores em sua petição inicial, estribado exclusivamente nos incisos II e III do art. 381 do CPC/2015 - os quais não guardam, em si, urgência/cautelaridade, exaurindo-se na produção da prova requerida, unicamente -, ignora ainda o fato de que a situação de urgência exigida pelos dispositivos legais em exame refere-se ao risco de perecimento do direito à prova propriamente dito.6.1 Na espécie, os demandantes promoveram a subjacente ação de produção antecipada de provas, com base nos incisos II e III do art. 381 do CPC/2015 (exclusivamente) com o expresso objetivo de tomar conhecimento, mediante análise documental e pericial, dos fatos ocorridos internamente na companhia demandada - que são objeto de investigação pelo Ministério Público Federal e pela Polícia Federal -, relacionados à atuação supostamente criminosa de seus administradores e de integrantes do bloco de controle, para, então, se for o caso, ajuizar eventual e futura ação de responsabilidade civil (perante o Tribunal arbitral, ressalta-se). Sem tecer nenhum argumento a respeito de eventual risco de perecimento do seu alegado direito à prova, o que se afigura absolutamente condizente com os fundamentos legais vertidos na inicial, os autores pugnaram pela apresentação de documentos ali indicados (relativos ao período de janeiro de 2014 a 31 de dezembro de 2018), bem como pela realização de perícia destes, inexistindo, portanto, o requisito de urgência/cautelaridade exigido no art. 22-A da Lei de Arbitragem.6.2 Peremptória, nesses termos, a reforma do acórdão recorrido. Não instaurada a jurisdição estatal, em cooperação à arbitragem, consoante o art. 22-A da Lei de Arbitragem, deve o presente processo ser extinto sem julgamento de mérito, tornando-se sem efeito toda e qualquer deliberação judicial nele exarada.7. Recurso especial provido.
Prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, acordam os Ministros da Terceira Turma, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.Os Srs. Ministros Moura Ribeiro, Nancy Andrighi e Ricardo Villas Bôas Cueva (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator. Não participou do julgamento o Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino (art. 162, § 4º do RISTJ).
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