Sérgio Marcelino

Doméstica - Horas Extras - Ausência de Controle de Frequência - Ônus da prova da Doméstica

Este assunto é palpitante, pois a discussão jurisprudencial e doutrinária é muito grande.  

Uma questão jurídica muito intrigante no tocante ao ônus da prova da jornada de trabalho da empregada doméstica está contida na Lei Complementar nº 150, de 1º de junho de 2015 regulamentou às regras sobre o contrato de trabalho das empregadas domésticas, já que, na minha opinião conflita frontalmente com a Lei nº 13.467, de 13 de junho de 2017.

A Lei Complementar nº 150/2105, tratou o assunto relativo à empregada doméstica, e no tocante ao ônus da prova em relação às horas extraordinárias realizadas pela doméstica quando a empregadora não manteve registros de frequência, ficou taxativamente ao encargo das empregadoras.

Por outro lado, a Lei nº 13.467/2017, que tratou da regulamentação da Reforma Trabalhista, apesar de ser originária de 2 (dois) anos após a

Lei Complementar nº 150, ficou firmado que o ônus da prova será do reclamante, e que as empresas só atrairiam o ônus da prova para si, caso a empresa tivesse 10 (dez)

empregados ou mais.

É no mínimo sem sentido que a legislação tenha beneficiado uma empresa com até 10 (dez) empregados e ter penalizado às empregadoras de domésticas, tendo apenas uma empregada doméstica contratada.

Ressalte-se ainda que, em muitos casos a doméstica dorme na casa da empregadora, onde se verifica ainda maior dificuldade de ser controlada a jornada de trabalho da doméstica.

É importante se frisar que, o artigo 45 da Lei Complementar nº 150/2015, diz textualmente que, as matérias tratadas na referida Lei e que não sejam reservadas constitucionalmente a Lei Complementar, poderão ser objeto de alteração por Lei Ordinária, o que demonstra que a Lei nº 13.467 advinda em 2017, para fazer ajustes na Reforma Trabalhista não foi omissa, apenas não foi expressa em relação ao controle de horário de trabalho em relação às domésticas, mas, não poderia o legislador dar entendimento diverso em relação à mesma matéria em atenção ao ônus da prova em relação aos horários extraordinários, devendo então ser o entendimento correto que a residência que contrate menos de 10 (dez) empregadas domésticas não será obrigada a manter registro de frequência, ademais, nos casos de empregadas domésticas, sendo um ponto de confronto entre as legislações acima descritas.

Como paliativo para mitigar o absurdo jurídico do caso apresentado, a jurisprudência vem concordando que a jornada de trabalho declinada na exordial tenha presunção relativa, podendo ser elidida através de prova testemunhal e até mesmo pela confissão em contrário da própria doméstica que muitas vezes exacerba o número de horas extras ao ponto de colidir de frente com os princípios da boa fé, da verossimilhança e da primazia da realidade, cujos princípios devem nortear a conduta do bom julgador.

E na proteção do direito ao bem da verdade real a jurisprudência vem neste sentido, conforme pode ser observada a seguir:

TRT – 3 – RECURSO ORDINÁRIO TRABLHISTA RO 00101570420195030084 MG 0010157-04.2019.5.03.0084 (TRT-3).

EMPREGADO DOMÉSTICO. JORNADA DE TRABALHO. ÔNUS DE PROVA. A partir da publicação da Lei Complementar nº 150/2015 passou a ser “obrigatório o registro do horário de trabalho do empregado doméstico por qualquer meio manual, mecânico ou eletrônico, desde que idôneo”. Assim, em relação ao período do contrato de trabalho posterior à vigência da lei, é ônus do empregador comprovar a jornada de trabalho do empregado doméstico mediante a juntada dos controles de frequência, de modo que a ausência de apresentação injustificada gera presunção relativa de veracidade da jornada declinada na inicial, a qual pode ser elidida por prova em sentido contrário (inteligência da Súmula – 338, I, do TST).

A meu ver, na verdade a Súmula - 338 do TST - Tribunal Superior do Trabalho não devia ser aplicada na relação de emprego doméstico, e esta é a opinião que vem tomando forma e inclinando a jurisprudência neste norte, onde praticamente define a inversão do ônus da prova em relação ao que está disposto na Lei Complementar nº 150/2015, vejamos a jurisprudência do TRT da 10ª Região: 

TRT – 10 – RO ACÓRDÃO 2ª TURMA/2019 RECURSO ORDINÁRIO TRABALHISTA RO 0000027032019510000 DF (TRT-10).

EMPREGADA DOMÉSTICA. HORAS EXTRAS. AUSÊNCIA DE CONTROLE DA JORNADA DE TRABALHO. ÔNUS DA PROVA. Embora o empregador doméstico esteja obrigado desde 2015 a manter registro do horário de trabalho do empregado doméstico, a ausência dos documentos na vida contratual das partes representa mera irregularidade administrativa. Havendo controvérsia quanto à jornada de trabalho efetivamente cumprida o ônus da prova é do autor. A Súmula/TST 338 não se aplica à relação de emprego doméstico porque foi editada em 2005 no contexto da organização de empresa com mais de 10 empregados (CLT, art. 74, §2º) inspirada na profissionalização capitalista e aptidão para a prova. Este contexto não guarda parentesco com o ambiente familiar da relação de emprego doméstico. O tratamento da prova documental, aqui, é o civil e não o empresarial. ESTABILIDADE GESTANTE. RECUSA À REINTEGRAÇÃO. GARANTIA À ESTABILIDADE PROVISÓRIA. INDENIZAÇÃO SUBSTITUTIVA DEVIDA. Apesar do desinteresse da reclamante em ser reintegrada ao emprego, e da brevidade do contrato de trabalho, a jurisprudência estabelecida reconhece que persiste a responsabilidade do empregador quanto à indenização pela estabilidade provisória da gestante, sem nenhuma limitação temporal.

Espero ter contribuído para que advogados e advogadas consigam viabilizar as suas defesas sobre as horas extras requeridas de forma exacerbadas em iniciais desprovidas da verdade real, e que muitas  vezes tem a única finalidade o locupletamento ilícito da parte requerente e do seu patrono aético.

(Este artigo foi escrito e publicado pelo advogado Sérgio Marcelino Nóbrega de Castro).

Sérgio Marcelino
Escrito em 15 de abril de 2021, por Sérgio Marcelino Advogado militante há 30 anos, atuando nas áreas cível, família, consumidor, trabalhista e criminal. Recebeu em 2004 a láurea de "melhores da advocacia do Brasil", representando a Paraíba. Em 2010 recebeu o prêmio "Heitor Falcão".

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