Sérgio Marcelino

Advogado foi punido por abandonar plenário do júri após ter seu pedido negado de aplicação da Súmula - 7 do STJ

O STJ - Superior Tribunal de Justiça foi criado pela Constituição Federal de 1988, que atribuiu-lhe a competência para uniformizar a interpretação da lei federal em todo o Brasil, seguindo os princípios constitucionais e a garantia e defesa do Estado de Direito.

Este artigo tem a intenção de comentar os desdobramentos da aplicação da Súmula nº 07 do STJ - Superior Tribunal de Justiça, e vem como coadjuvante de uma decisão do STJ - Superior Tribunal de Justiça, da lavra da Quinta Turma, que manteve uma multa que foi aplicada a um advogado que abandonou, segundo a decisão daquela Corte de Justiça, injustificadamente, o plenário do julgamento do júri.

O polêmico caso ocorreu em razão de o representante da acusação ter desenrolado perante os jurados, um extrato com mais de 30 (trinta) metros de folhas relacionadas aos antecedentes criminais do réu, tendo, em ato contínuo o advogado de defesa requerido a  dissolução da sessão de julgamento, respaldando o seu pedido na Súmula nº 07 do STJ - Superior Tribunal de Justiça.

Como o seu pedido foi indeferido, o procurador abandonou o plenário do júri, e por esta razão foi multado, tendo o caso aportado ao STJ para julgamento do caso. 

Segue a decisão do caso inusitado, o qual foi relator da matéria o ministro do STJ - Superior Tribunal de Justiça Joel Ilan Paciornik, conforme pode ser vista a Ementa do Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1821501/PR a seguir:

Ementa

PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO. VIOLAÇÃO AO ART. 265 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL ? CPP. ABANDONO INJUSTIFICADO DE PLENÁRIO POR ADVOGADO. IMPOSIÇÃO DE MULTA RESTABELECIDA. REVALORAÇÃO JURÍDICA DE FATO INCONTROVERSO. INAPLICABILIDADE DO ÓBICE DA SÚMULA N. 7 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA ? STJ. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. A Quinta Turma tem rechaçado a postura de abandonar o plenário do Júri como tática da defesa, considerando se tratar de conduta que configura sim abandono processual, apto, portanto, a atrair a aplicação da multa do art. 265 do Código de Processo Penal. Precedentes. (RMS 54.183/SP, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, Rel. p/ Acórdão Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, DJe 2/9/2019). 1.1. No caso em tela, o Advogado abandonou o Plenário após indeferido seu pleito de dissolução da sessão motivado no fato do representante da acusação ter desenrolado perante os jurados um extrato de sistema com mais de 30 metros de folhas que supostamente se tratavam dos antecedentes criminais do réu. 1.2. Conforme precedentes, o representante do Ministério Público pode fazer referência aos antecedentes criminais durante os debates no julgamento pelo Tribunal do Júri, inexistindo violação ao art. 478 do CPP. Ainda, eventual abuso de direito poderia ter sido impugnado por meio próprio. 2. A revaloração jurídica de fatos considerados no acórdão proferido pelo Tribunal de origem não configura o revolvimento fático-probatório vedado pela Súmula n. 7 do STJ. 3. Agravo regimental desprovido. (AgRg no REsp 1821501/PR, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 28/04/2020, DJe 04/05/2020).

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É importante saber como o STJ - Superior Tribunal de Justiça aplica aos casos concretos a Súmula nº 7, na questão de reexame e revaloração da prova.

Aproximadamente um ano após a instalação da Corte de Justiça, em meados de de 1990, os ministros do STJ - Superior Tribunal de Justiça já percebiam que a Casa de Justiça não poderia se transformar numa terceira instância, tendo os julgamentos  dos Recursos Especiais uma de suas principais atribuições.

Neste norte, o STJ tratou logo de editar a Súmula 7, cujo texto diz: "A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial".

Logo após a sua edição, a Corte de Justiça passou a aplicar de forma rotineira à aplicação da mencionada Súmula, estabelecendo a morte fulminante de inúmeros Recurso Especiais, onda o falecimento precoce ocorrias simplesmente pelo fato de, na maioria esmagadora dos casos dos Resp, terem a intenção de revolver a matéria probatória, daí, os inúmeros julgamentos dos Resp. sem o julgamento do mérito, por esbarrarem na Súmula nº 7.

Não foi de forma diferente nos Tribunais de segunda instância, que passaram a indeferir a subida dos Recursos Especiais, com base na mesma Súmula, o que ensejava os Recursos de Agravos de Instrumentos para forçarem às subidas dos Recursos Especiais. 

Ao longo do tempo, vários Recursos Especiais bem elaborados passaram a demonstrar a desnecessidade de reanálise de fatos e provas, e ultrapassarem a barreira criada pela Súmula nº 7.

Foi ficando patente que em determinados casos a revaloração da prova ou de dados explicitamente admitidos e delineados na decisão da qual se recorre não implicaria o reexame de fatos e provas, vetados pela Súmula nº 7.

Em decisão da Quarta Turma da mesma Corte de Justiça foi confirmada a decisão monocrática do ministro Março Buzzi que repisou à questão da revaloração da prova no Recurso de uma Transportadora, (Resp. 1.036.178), onde o ministro Buzzi justificou que a decisão apenas deu definição jurídica diversa aos fatos expressamente mencionados no acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo.

Segundo o ministro Março Buzzi, o reexame de prova é uma reincursão no acervo fático probatório mediante a análise detalhada de documentos, testemunhos, contratos, perícias, dentre outros. Nestes casos, o relator não pode examinar mera questão de fato ou alegação de error facti in judicando (julgamento errôneo da prova).

No entanto, o ministro explicou que o error in judicando (inclusive o proveniente de equívoco na valoração das provas) e o error in procedendo (erro no proceder, cometido pelo juiz) podem ser objeto de recurso especial. E que, segundo o ministro, a revaloração da prova constitui em atribuir o devido valor jurídico a fato incontroverso sobejamente reconhecido nas instâncias ordinárias, prática francamente aceita em sede de recurso especial.

Por outro lado, a mesma Quinta Turma, anteriormente, no ano de 2005, reconheceu que a revaloração da prova ou de dados explicitamente admitidos e delineados no decisório recorrido não implica o vedado reexame do material de conhecimento. Porém, ao julgar o recurso, os ministros decidiram aplicar a Súmula 7 ao caso, na época sobre a lavra do ministro Felix Fischer, na relatoria do Resp. 683.702.

Naquela oportunidade, o ministro Fischer teceu algumas considerações acerca da diferença entre reexame e revaloração de prova, que, segundo ele: A revaloração de elementos aceitos pelo acórdão do tribunal de origem é questão jurídica e que não se pode negar às instâncias superiores a faculdade de examinar se o direito à prova foi malferido ou se os juízes negaram o direito que as partes têm de produzi-la. Isto é, não é só em consequência do erro de direito que pode haver má valoração da prova. Ela pode decorrer também do arbítrio do magistrado ao negar-se a admiti-la.

Há precedentes antigos, que datam de 1998, que abriram espaços para a tese de revaloração da prova no STJ, onde a mesma Quinta Turma, em Recurso Especial interposto pelo assistente de acusação, restabeleceu a sentença que condenou um motorista por homicídio culposo ao volante, conforme consta no Resp. 184.156, onde, apesar de as testemunhas terem sido uníssonas ao afirmar que o veículo era conduzido em alta velocidade, no entanto, em razão de constarem nos autos duas perícias de universidades renomadas que foram divergentes quanto à velocidade, os desembargadores, por maioria, adotaram a presunção de inocência para absolver o motorista no julgamento de apelação.

O relator destacou em seu voto que o princípio do livre convencimento, que exige fundamentação concreta vinculada à prova dos autos, não se confunde com o princípio da convicção íntima. De acordo com o ministro Fischer, a convicção pessoal, subjetiva, do magistrado, alicerçada em outros aspectos que não a prova dos autos, não se presta para basear uma decisão.

O princípio do livre convencimento, asseverou, não afastou o magistrado do dever de decidir segundo os ditames do bom senso, da lógica e da experiência. A apreciação da prova não pode ser imotivável e incontrolável, do contrário seria arbitrária, explicou o ministro. E sempre que tais limites se mostrem violados, a matéria é suscetível de recurso ao STJ.

A Primeira Turma também já considerou possível a revaloração da prova delineada nos autos. Num dos recursos que discutiu a tese, em 2006, o então ministro do STJ Luiz Fux, baseou-se em passagens do voto-condutor do julgamento no Tribunal de Justiça de São Paulo para atender a recurso interposto por uma contribuinte no Resp. 734.541 sobre a isenção do Imposto de Renda por ter retirada a mama. 

De acordo com o ministro, a revaloração da prova delineada na decisão recorrida, suficiente para a solução do caso, é, ao contrário do reexame, permitida no recurso especial. No caso, o próprio acórdão do TJSP, em algumas passagens, reconheceu que" a cura, em doenças com alto grau de retorno, nunca é total, e mais: "O que se pode dizer é que, no momento, em face, de seu histórico pessoal, não apresenta ela sintomas da doença.

Posição semelhante adotou a Quarta Turma, em julgamento que tratou de ação de reconhecimento de tempo de serviço ajuizadas contra o INSS. Os ministros entenderam que não ofende o princípio da Súmula 7 emprestar, no julgamento do recurso especial, significado diverso aos fatos estabelecidos pelo acórdão da segunda instância (REsp 461.539).

O relator, ministro Hélio Quaglia Barbosa, esclareceu: Inviável é ter como ocorridos fatos cuja existência o acórdão negou ou negar fatos que se tiveram como verificados. De acordo com o ministro, o voto proferido em recurso especial em momento algum negou os elementos fáticos reconhecidos no acórdão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5), apenas, com base neles, chegou a entendimento diverso, restabelecendo decisão de primeiro grau.

Estaria o STJ - Superior Tribunal de Justiça revendo, em tese, a Súmula nº 7, que tantos Recursos Especiais não conseguiram superá-la?, 

Não seria o momento oportuno para fulminar de vez a Súmula nº 7, em razão da mudança de entendimento ao longo dos anos e dos diversos julgamentos que passaram na Corte de Justiça.

Uma discussão que ainda vai dar muito trabalho para ser rendeirizada, notadamente, sobre os aspectos do alcance e conteúdo da mesma.

Há realmente a necessidade de filtragem dos Recursos Especiais, para que seja evitado que o STJ - Superior Tribunal de Justiça seja uma terceira instância, contudo, neste entendimento de revaloração da prova, conforme os casos apontados anteriormente, verifica-se que a tendência é aquela Corte de Justiça passe a ser uma terceira instância, o que aliás já é tratada assim por muitos juristas do Brasil.

As decisões conflitantes dentro da mesma Casa de Justiça será que não demonstram a desnecessidade de existência de uma Corte de Justiça com fins de oportunizar a procrastinação dos processos.

Neste norte que vêm tratando os casos que lá aportam fica evidente o benefício aos afortunados que podem levar um processo ao reexame na terceira instância, que, com advogados(as) habilidosos (as), têm uma terceira chance, que os pobres dificilmente terão, com raríssimas exceções.

Observem, a Súmula nº 7, proíbe a reanálise das provas, mas, não impede que as provas constante nos autos sejam revaloradas, ou seja, tenham um julgamento sobre o valor que pesou na decisão do Tribunal "a quo".

Não estaríamos oportunizando uma semântica que só beneficia poucos, em detrimento de muitos que pagam o custo de manter um Tribunal de terceira instância apenas para ricos e poderosos?

Ou será que é correto se afirmar que: "Ao órgão recursal é admissível conferir-lhe outra interpretação. Cumpre analisá-la. A sentença não é mero trabalho acadêmico; apóia-se na realidade da vida e por isso precisa considerá-la?

Para a reflexão: Deve haver uma distinção entre a valoração da prova de sua interpretação, já que a primeira faz juízo de legalidade do meio de prova e do procedimento de sua coleta e a segunda, se traduz na adequação do resultado da instrução ao postulado pelas partes.

O Recurso Especial não emite comando meramente declaratório, já que ultrapassa este ponto, e dependendo do caso, pode ser constitutivo.

Esse é o propósito da Constituição Federal do Brasil.

(Artigo escrito e publicado pelo advogado Sérgio Marcelino Nóbrega de Castro).

Sérgio Marcelino
Escrito em 12 de maio de 2020, por Sérgio Marcelino Advogado militante há 30 anos, atuando nas áreas cível, família, consumidor, trabalhista e criminal. Recebeu em 2004 a láurea de "melhores da advocacia do Brasil", representando a Paraíba. Em 2010 recebeu o prêmio "Heitor Falcão".

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